Uma vez eu li que, no Vale do Silício, as pessoas tendem a não se concentrar na governança. E hoje estamos vendo em tempo real como a má governança pode destruir uma empresa.
A OpenAI Inc foi lançada com uma estratégia original: nasceu como uma organização sem fins lucrativos há oito anos, com o objetivo de desenvolver uma IA responsável e segura. A companhia tinha uma estrutura sensata. Mas, com o passar do tempo, talvez a pressão para monetizar essa tecnologia tenha sido grande demais. E a tentação de abandonar a estratégia inicial parece ter crescido.
Mesmo após se tornar uma empresa “de lucro limitado” em 2019, a OpenAI manteve uma estrutura incomum, que definia claramente o que os investidores podiam — e não podiam — esperar da liderança da startup. Parte do objetivo era limitar o potencial de ganho financeiro e também manter um controle próximo sobre as implicações sociais da tecnologia. Surgem tensões de governança, o dilema sobre o lucro, em um crescente descompasso entre aqueles que financiam a OpenAI (predominantemente a Microsoft) e aqueles no controle (o conselho sem fins lucrativos).
A governança de corporações com fins lucrativos é difícil. Em corporações sem fins lucrativos, é ainda mais. Mas o caso da Open AI parece ser o mais complicado de todos. Afinal, governar um negócio com fins lucrativos com um conselho que não tem esse objetivo é contraditório e insustentável. Nenhum conjunto de regras escritas pode forçar investidores com mentalidade de lucro a se comportarem como se fizessem caridade.
Conselhos podem perder sua independência e se tornar subordinados à gestão da empresa (como vimos na Enron), podem operar em seus próprios interesses (caso da Tesla), podem ser negligentes (como aconteceu no Lehman Brothers) ou pouco inquisitivos (como na Theranos). Mas em entidades com fins lucrativos normais, os investidores geralmente têm alguma capacidade de influenciar a estratégia, seja através de direitos de governança, seja com assentos no conselho. Não na OpenAI.
É um dos raros casos em que as pessoas que fornecem o capital não têm algum grau de voz ou controle sobre os rumos da empresa. É o caso de um de seus primeiros investidores e CEO da companhia nos últimos anos, Sam Altman, que foi demitido na semana passada. De fato, não sei as razões precisas pelas quais o conselho demitiu Altman – acho que ninguém sabe, até agora! A empresa apenas divulgou uma declaração aos funcionários de que a demissão de Altman não foi o resultado de “má conduta ou qualquer coisa relacionada às nossas práticas financeiras, empresariais, de segurança ou de privacidade”, mas foi devido a uma “falha na comunicação entre Sam Altman e o conselho”.
Mas, por tudo que acompanhei até agora, a abordagem da empresa em relação à governança era uma bagunça comprovada e isso refletiu na demissão de seu CEO. O ritmo vertiginoso dos eventos mostra que o caos predominou, pelo menos no conselho da OpenAI, já que esta passou longe de uma transição ordenada, o maior objetivo de qualquer conselho de administração quando um CEO é substituído. Na minha visão, outras evidências da falta de atenção à governança são:
– Falha nas responsabilidades de supervisão: conselho pequeno e que carece da experiência que seria esperada de uma empresa de seu tamanho e importância.
– Falha na tomada de decisões: não foi prudente nem transparente e ainda faltou bom senso.
– Falha com a equipe: o presidente do conselho, Greg Brockman, não estava presente durante a chamada na qual Altman foi dispensado, segundo vários relatos. Isso é inédito em um cenário de governança tradicional. Brockman anunciou mais tarde que estaria deixando o conselho e depois deixou a empresa completamente, acompanhando Altman rumo à Microsoft.
– Falha com os investidores: muito embora o conselho não fosse obrigado a consultar os principais investidores da OpenAI, não conseguir o apoio deles não fez nenhum favor à empresa.
– Falha na estrutura: o maior impacto se deu sobre a estrutura, que foi negligenciada enquanto a empresa mudava rapidamente.
Até 20/11, centenas de funcionários da OpenAI tinham assinado uma carta pedindo a renúncia do conselho e a volta de Sam Altman à empresa. Uma saída em massa de funcionários é esperada nos próximos dias, caso a decisão não seja revertida.
Em 22/11, de acordo com a Reuters, “A OpenAI, fabricante do ChatGPT, chegou a um acordo para que Sam Altman retorne como CEO dias após sua destituição, encerrando discussões frenéticas sobre o futuro da startup no centro de um boom de inteligência artificial. A empresa também concordou em reformular o conselho de administração que o havia demitido. A OpenAI nomeou Bret Taylor, ex-co-CEO da Salesforce, como presidente e também nomeou Larry Summers, ex-Secretário do Tesouro dos Estados Unidos, para o conselho.”
Certamente, muito mais está por vir….
O que me leva à conclusão apresentada já no comecinho desse post e a uma dúvida. A governança corporativa não é luxo: é uma questão existencial. Por fim, o conselho da sua empresa está preocupado com isso?